quarta-feira, 25 de abril de 2007

Crônica do dia a dia




Jaú, 03 de setembro de 1986.

Com tanto assunto sobre política, desafios verbais, violência, essa reforma agrária que está num impasse, que tal escrever sobre coisas mais amenas?
Vai daí que no dia 31 de julho, minha família estava presente na platéia do Palácio das Convenções do Anhembi. Era colação de grau dos formandos da Faculdade de
Engenharia Industrial e ,um deles, era meu neto (avó coruja, não?).
Para falar a verdade, essas festas " não fazem o meu gênero".São cansativas, monótonas, com tanto discurso e entrega interminável de diplomas. Assim o pensei, lembrando- me de outras que há tempo as assistia.
Mas meu neto prometeu-nos descontração, alegria, contando para isso, com a orquestra e coral Bacarelli, um organista de fama e um bom locutor que discorria sobre o desenrolar das festividades.
De fato, estava tudo bem organizado. Os formandos alinhadíssimos nos seus
"smokings", tomaram lugar no palco atrás da grande mesa ocupada pelos professores, diretores e paraninfo.

A decoração estava belíssima. O Hino Nacional, cantado pelo coral, deu início à solenidade. Antes , porém, que o locutor anunciasse outro número do programa, o inesperado foi acontecendo. Um formando levantou-se e sem a menor cerimônia, abriu um cartaz com os dizeres: " Manhê, tô aqui!". Quando sentou-se foi a vez do outro levantar-se, com o seu : " Paiê, você não acreditava". E assim, cartazes humorísticos foram aparecendo em todos os intervalos. Aquela irreverência, descontração e informalidade dos rapazes tornaram a festa alegre e as horas passaram céleres.
Contribuíram também, as músicas do coral, bem ao sabor daquela mocidade tão linda,
tão descontraída. As composições de Milton Nascimento, Chico Buarque, foram-se sucedendo. Para terminar, saudando a volta dos formandos ao lar, foi apresentada a música; " Estou voltando".
Confesso que não vi o tempo passar, nem fiquei entendiada com os discursos que, aliás, foram curtos e precisos.

VOVÓ GUITA

Carta da Vovó



Jaú, 4 de dezembro de 1986.

Meu Neto

Há tempo não lhe escrevo. Acontece que a vida de sua avó sofreu muitos imprevistos.
Aquele barquinho que navegava em águas tranquilas, quase soçobrou em meio a grandes tempestades.Quantas vicissitudes!
Vi seu tio, tão moço, cheio de esperanças, ir pouco a pouco, se " definhando", sem que a medicina fosse capaz de livrá-lo de insidiosa moléstia. Logo seu tio, que nunca fumou, sempre teve cuidado com a saúde, foi acometido de câncer nos pulmões. Não dá para entender. Lembra-se como ele forte, vendia saúde, gabava-se de nunca precisar de remédios?
Mas, os desígnios de Deus são imutáveis. Mesmo assim eu lhe rendo graças por ter me dado um genro que soubesse oferecer à minha filha e aos seus filhos anos de felicidade.
Dou graças à Deus pelos vinte e três anos de um casamento sólido, quando há hoje tantos lares destruídos. E como foram unidos. Esposa e filhos se desvelaram junto ao leito, sem fraquejarem, solícitos ao menor apelo do doente, até os seus últimos momentos. Ainda os vejo ora ajeitando a máscara de oxigênio, ora o soro, com muito amor e carinho.
Dou graças à Deus pelos amigos que ele soube conquistar em Presidente Prudente e que foram de uma grande lealdade.Revezavam-se no atendimento ao doente dando-lhe palavras de conforto e amparo.
Agradeço aos adeptos de todas as religiões, que procuravam minorar-lhe os sofrimentos com suas preces. Lembro-me dele quando mesmo gerenciando banco, procurava estuda à noite, juntando ao diploma de contador da Academia Horácio Berink, os de economista, administração de empresas e
advogado. Não media sacrifícios para vencer na vida, ocupando em Prudente os cargos de Presidente da Associação Comercial do Lions Clube e do Mobral.
Recebeu da Cãmara Municipal a medalha de mérito " Colonizador Cel. José Soares Marcondes"
pelos serviços prestados à coletividade prudentina, homenagem essa que contou com o apoio da imprensa, rádio, dos sindicatos e associações. Nela esteve reunida toda a família e confesso- lhe que ficamos envaidecidos e emocionados. Quis o destino que ele não pudesse colher nem o fruto da aposentadoria.
Eu e seu avô ficamos eternamente gratos com o calor humano que os prudentinos mostraram nessa fase triste que passamos. Agradecemos também à todos aqui que compartilharam com a nossa dor. Mas, sua última vontade foi cumprida: queria ser enterrado em Jaú, junto dos parentes.
Queria Deus
que depois desta tempestade, venha a bonança, embora a saudade seja imorredoura.

VOVÓ GUITA